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terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

"O Pulso Ainda Pulsa"




Frio... Essa é a descrição perfeita para o que eu sentia naquele momento, naquele domingo chuvoso, gélido e estranho, talvez o mais estranho de toda a minha vida. Também sentia medo. Muito medo. As ruas desertas e escuras daquela pequena e pacata cidade que outrora tanto quis conhecer, naquele momento me causavam pânico, angústia, sofrimento. Era um misto de indignação, ódio, tristeza e dor. A dor que assolava meu coração era tão intensa e profunda que eu estava a ponto de rasgar meu peito e arrancá-lo dali, a fim de que toda aquela angústia desaparecesse. As lembranças dos últimos dois anos e de todos os momentos felizes que neles vivi, me causavam náuseas e me faziam caminhar cada vez mais rápido por entre as ruas. A impressão que eu tinha é que quanto mais eu pensava e todas aquelas imagens desconexas surgiam na minha mente, mais a chuva caía. E com mais força. E então eu agilizava os passos e maior ficava a escuridão ao meu redor. Um enorme e lindo filme passava pela minha confusa cabeça: o dia em que nos conhecemos, na biblioteca da faculdade; as tantas segundas-feiras em que almoçávamos juntos; os cafés da tarde que tomávamos, enquanto debatíamos a respeito do livro em que estávamos lendo no momento; as festas; os restaurantes; as milhares de sessões de cinema madrugada à fora; os teatros; as pizzas de sexta-feira à noite, na minha casa ou na dele; os beijos; o sexo, tímido no início mas fabuloso e apaixonado no final; o pedido de casamento, ajoelhado no meio de uma rua deserta e escura, em um dia chuvoso após uma grande briga… Talvez por isso, inconscientemente, esse tenha sido o meu local de refúgio no momento de dor: as ruas desertas e escuras de um dia chuvoso, em uma desesperada tentativa de relembrar o passado tão feliz, e buscar respostas a todos os últimos estranhos e inesperados acontecimentos. 

Enquanto caminhava rápido, tentava em vão puxar o ar para meus fracos pulmões, e quanto mais o fazia, mais náuseas sentia e mais as minhas forças se esvaiam. De repente senti minhas pernas fraquejarem, minha vista escureceu e então eu caí. Abaixo de mim havia um solo duro, frio e molhado, e rapidamente meu corpo ficou encharcado. Enquanto desfalecia, ouvia o forte barulho da chuva que tocava o chão e, ao longe, escutava a imaginária música instrumental que era tema da festa de dois dias atrás. Ouvia a música cada vez mais distante e então o breu tomou conta de mim. Nada mais eu vi, nem ouvi e nem senti. Naquele momento fiquei reduzida à matéria, a um corpo molhado estendido no chão, sem alma, sem emoção. Só.

Sem ter noção do tempo que passou, lentamente minha respiração voltou e novamente sentia os músculos e ossos do meu corpo, agora rígido e dormente. Ouvi um som alto e familiar. Senti um incômodo nos olhos ainda fechados e essa sensação aumentava à medida em que o tal som se aproximava. Uma forte luz piscava na direção dos meus olhos e então percebi que um carro se aproximava. Apesar dos meus olhos não me obedecerem e continuarem fechados, notei que o carro parou. Uma porta se abriu, bateu com força suficiente para me fazer encolher e senti que alguém se aproximava. Senti medo. E tive curiosidade de saber o que estava acontecendo, mas não conseguia abrir os olhos, estavam pesados e todo o meu corpo doía. Percebi alguém do meu lado. Suas fortes mãos tocavam meu pulso e meu peito, talvez em uma tentativa de buscar minha frágil respiração e encontrar vida em mim. Não posso afirmar que ainda tenho uma vida depois de tudo o que passei no dia de hoje… Ouvi uma voz e senti umas leves sacudidas, mas não consegui identificar a voz e compreendê-la. De repente senti um forte solavanco e um frio intenso percorreu minha espinha. Tentava, com as forças que me restaram, abrir os olhos, mas foi mais uma tentativa frustrada. Procurei, então, relaxar, e confiar naquela pessoa estranha que me colocava no colo e me levava para algum lugar que eu desconhecia. O barulho da chuva continuava em meio ao silêncio sepulcral. Senti passos largos e ágeis, e logo eu estava em um lugar fechado, quente e silencioso, exceto por um som muito baixo mas reconhecível, de uma música clássica. As fortes mãos acariciavam as minhas, molhadas e geladas, e logo senti um pano por sobre meu corpo frio. Eu tremia de frio e de adrenalina. Notei que o aquecedor estava ligado, para a minha sorte, e aos poucos o gelo foi desaparecendo e meus músculos se soltando. Lentamente meus olhos foram se abrindo, ainda com um certo sacrifício, mas agora com um incentivo maior: descobrir quem era essa criatura que me tirava do frio e me livrava do perigo. Comecei a enxergar uma imagem borrada, como uma sombra, e logo notei que se tratava de um homem. Ele era grande, bem maior do que eu, e apesar da escuridão, me olhava atentamente e intensamente. Quando finalmente meus olhos se abriram, arregalei-os, em um misto de susto, vergonha e medo daquele ser desconhecido e amigável, que naquele fatídico dia, me estendia a mão. Ele levou o dedo indicador à boca e fez um singelo sinal me pedindo para relaxar, em um claro sinal de que não me faria mal. Olhei profundamente dentro dos seus olhos e notei preocupação, compaixão e curiosidade. Ele não era bonito, tinha traços grosseiros, mas era muito, muito charmoso. Por um breve momento, senti uma excitação, que foi embora no exato instante em que me lembrei do triste motivo que me levou até ali, naquela desconfortável situação. Não falamos nada. Ele nada perguntou. E eu nada respondi. Apenas acariciava as minhas mãos enquanto voltavam à temperatura normal. Aquele toque forte e macio me provocou calafrios e ficamos por alguns longos segundos nos olhando profundamente. Tentei balbuciar algumas poucas palavras, em vão, e antes mesmo que eu pudesse me arrepender, falei em um tom baixo e lento:

"-Eu… fui… abandonada pelo meu… marido… na lua-de-mel…"

Cada palavra que eu dizia feria forte o meu peito, provocando pontadas agudas e aumentando a angústia esquecida na hora do desmaio.

Ele me olhou com ternura e pena, apertou com força minhas mãos, e nesse momento senti uma lágrima escorrer no meu rosto. Então angustiado ele perguntou:

"-Sinto muito! O que eu posso fazer por você, para aliviar essa dor?" Ele me olhava como quem olhava para uma criança abandonada.

"-Apenas me abrace… por favor!"

Ele me olhou com surpresa, e ao mesmo tempo, com excitação, e antes que eu pudesse pensar no que havia dito, aquele homem grande, forte e desconhecido, me tomou nos seus braços e me apertou com força. Desabei em uma sequência cadenciada de choro e soluços que ensopavam sua camisa e o faziam me abraçar ainda mais forte. A excitação aumentava cada vez mais e então ele me beijou, desesperadamente. Eu já não pensava em mais nada, apenas nele e no seu beijo forte e delicioso. Ele me acariciava por sobre o tecido molhado das minhas roupas e tudo o que eu queria naquele momento, era ele. Ele tirou minhas roupas com urgência, no compasso da grave voz do tenor da música que tocava, embalando o nosso sexo, desconhecido, mas espetacular. Em uma explosão de sentimentos, sentidos e sensações, caí em seu colo, o abracei mais forte que pude, e adormeci, profundamente.

A luz do dia incomodava meus olhos. Não havia sol, mas havia muita luz. Ouvi uma voz me chamar. Senti meu corpo ainda doído, mas a tristeza um pouco menor. Então, quando abri os olhos naquela manhã iluminada e ainda fria, um senhor estava perto de mim, preocupado, e disse:

 "-A senhorita está bem? Aconteceu alguma coisa? Posso lhe ajudar?"

 "-Eu… desmaiei… ontem à noite. Mas é estranho… chovia muito e um homem passou de carro, parou e me ajudou, mas… adormeci e não me lembro de mais nada. Por que ele me colocaria aqui na rua, no chão novamente?" Pronunciei tais palavras com um aperto no peito, ao pensar que aquele homem grande, tão gentil, que me ajudou no momento em que precisei, e que me beijou e fez sexo comigo como ninguém havia feito antes, havia me abandonado, assim como… meu marido…
"-Minha senhora, deve haver algum engano, a senhorita deve ter batido com a cabeça ou algo desse tipo, por que não há possibilidade de ninguém ter passado por aqui de carro. Essa rua está fechada há dois meses por causa de uma obra, e é impossível entrar, pois as barreiras são de cimento. É… a senhora quer ir ao médico, ou quer que eu ligue para alguém?"
Olhei atentamente para meu braço direito, enquanto o senhor esperava uma resposta.
"-Não, senhor, muito obrigada! Já estou me sentindo melhor e vou caminhando até o hotel onde estou hospedada. Muito obrigada!"
O senhor, então, foi se afastando de mim, me olhando confuso, e eu, fiquei ali, deitada, parada, observando a pulseira que agora estava no meu pulso direito, mas que até ontem à noite não estava. Imediatamente me lembrei de tudo o que aconteceu entre eu e aquele homem grande e forte, e instantaneamente senti uma pontada na minha virilha. Foi quando me dei conta de que estava sem calcinha…

Não sei o que aconteceu realmente. Se foi um sonho, ou se foi real. O fato é que a pulseira estava ali, no meu braço direito, e que a calcinha não estava mais ali, nas minhas partes íntimas.

Depois de tudo o que passei naquele dia triste, doloroso, frio e chuvoso, a grande lição que aprendi foi: aconteça o que acontecer, sempre vai haver alguém querendo você e fazendo você de tudo esquecer, nem que seja por um alvorecer...

Bianca Roriz

A Cobrança



Hum, mensagem para mim. Quem será?

- Oi, aqui quem está falando é o Marido, estou no messenger dela. Quero lhe dizer que não gostei de saber que vocês conversam pela internete. Que História é essa? Como pode uma coisa dessas? Não sabia que vocês eram amigos. Isso não vai ficar assim. Você vai ver! Enviado via web 19h.

 Será que respondo? Que ridículo, o cara entrou no messenger da esposa, leu a correspondência dela, o que acima de tudo é falta de educação e ainda quer tirar satisfações, sobre correspondências de amigos. Ah, vou responder:

- Oi, Você é mesmo quem diz que é?  Não acredito. Caraca, tu deve ser muito inseguro na vida, invadir o mensageiro da mulher e tirar satisfações de algo que não faz o menor sentido para você, e muito menos que lhe diz respeito... Mas vamos lá, você é muito tolo ao achar que “sua” mulher não tem amigos, não conhece pessoas legais e que não tem uma vida mesmo que você não esteja vendo... ou é tão infantilmente egocêntrico que acha que ela só existe enquanto está do seu lado? Enviado via celular 19h10.

- Não quero saber, você não tem o direito de falar com ela. Enviado via web 19h15.

- Hum, então ela precisaria protocolar uma solicitação em 3 vias para ter o direito de conversar com outras pessoas, necessitando assim do seu aval para que um diálogo pudesse ocorrer. Enviado via celular. 19h16

- Você é muito engraçadinho. Já te falei, sou o marido dela. Enviado via web 19h18.

- Ah, me desculpe eu não tinha entendido que ela era sua propriedade, foi mal. Pensei que seres pensantes tivessem autonomia de pensamento. Enviado via celular 19h20.

- Eu só quero saber há quanto tempo vocês tem um caso, seus Filhos da Puta? Enviado via web 19h21.

- Ah tá! Agora eu entendi... eu não estava entendendo a dimensão do problema. Foi mal... Deixa eu te explicar. Eu não tenho um caso com a “sua” mulher. Antes de julgá-la, você deveria agradecer que uma pessoa tão maravilhosa quanto ela, permitisse que um cara como você fizesse parte da sua vida. Tem sorte de ela ter te escolhido como companheiro e a verdade tem que ser dita, quem escolhe o parceiro é a mulher. E ela te escolheu... ó que maravilha! Enviado via celular 19h24.

- Não entendi, onde quer chegar? Enviado via web 19h25.

- Vou ser mais claro... Não procure chifres em cabeça de burro, porque não tem. Até porquê, se tivesse... Você passaria a ser chamado de unicórnio... E apague essas mensagens antes que ela veja o que você fez, Burrão! Enviado via celular 19h27.

Alex Huche